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Cidades

Beca e canudo: idosos se formam na arte de envelhecer bem 1h4s4

"Acredite: quem vai mandar no país, muito em breve, serão os idosos", aposta a professora da UnB Margô Gomes, criadora da Universidade do Envelhecer 212r6g

"Eu não aprendi a ler não, mas aprendi a ter amizade, a cuidar de mim", conta Antônia Gomes de Souza, 73 anos, junto a três de suas netas que não tiravam a mão de sua beca. A roupa indicava que, em instantes, a antiga doméstica receberia o primeiro diploma da vida. O sonho de ter o canudo em mãos tardou devido à condição financeira de sua família, que a destinou à vassoura e pá em vez do lápis e caderno.

Durante um ano e meio, Antônia foi a uma escola da Estrutural, perto de onde mora, para participar das aulas do UniSER: Universidade do Envelhecer, projeto da Universidade de Brasília (UnB). "Eu ia de ônibus, né, porque eu não pago agem", conta. Ela descobriu o curso a partir de uma amiga que estava responsável por angariar inscrições. "Eu dei meu nome, mas não sabia direito o que era. Aí eu comecei a ir e fui achando bom demais da conta. Ficar em casa, preocupada com as coisas, eu não gosto muito", rememora.

Mesmo sem o apoio de seus 10 filhos e 40 netos, quem abraçava a ideia de Antonia ir ao curso foram as menores da família, as 15 bisnetas. "Eu incentivava os meu filhos a irem pra escola, mas não deu certo no caso de nenhum deles. Nem dos netos. Aí, quando eu comecei a fazer o curso, eles não ficaram nada animados", relata.

O projeto 3s229


Em 2015, a professora da UnB Margô Gomes, depois de muita luta, conseguiu a aprovação de um projeto destinado à terceira idade na universidade. A ideia veio de Tocantins, onde a professora teve o primeiro contato com um programa que ensinava as pessoas a envelhecer. "E o envelhecimento social? Qual é o impacto na sociedade do envelhecimento de uma população toda?", indagava-se Margô, como em um primeiro movimento para lançar o projeto anos depois.

Sem recursos, o jeito foi conseguir parcerias com locais para realizar as aulas e angariar professores voluntários que tivessem alguma formação em gerontologia. Candangolândia, Taguatinga e Estutural abriram as portas e a Universidade do Envelhecer se estabeleceu nessas regiões.

"São aulas sobre alimentação, bem estar, o que posso e não fazer. amos até pelos direitos do idoso. Isso tudo com o enfoque para a formação de Educadores Sociais e Políticos em Gerontologia", detalha Margô sobre como se dá o curso.

Envelhecimento populacional 6u196v

O último estudo do Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística (IBGE) sobre a tendência de envelhecimento mostra que a população brasileira envelhece mais atualmente que nos anos anteriores e a quantidade de bebês reduz-se com o tempo. Com isso, a pirâmide etária brasileira dá sinais de que, em anos, poderá ser um triângulo invertido, com a base de idosos e ponta de crianças.

De 2012 para 2017, o Brasil ganhou 4,8 milhões de novos idosos - um crescimento de 18% desse grupo etário. Com isso, o Brasil conta com 30,2 milhões de pessoas com mais de 60 anos, sendo 56% mulheres e 44% homens.

"A gente não quer photoshopar a velhice, a gente quer entender que o ser humano tem um ciclo de vida e que a velhice é uma fase muito importante. A gente não pode mais negá-la. E o Brasil é um país grisalho. Acredite: quem vai mandar no país, muito em breve, serão os idosos", aposta Margô.

Resultados 4y1p55

Os formandos no curso da Universidade do Envelhecer acreditam que os resultados do aprendizado são práticos e visíveis. Em casa, o casal Adiniz Felix Ferreira, 86, e Miriam Borges Ferreira, 59, mudou a rotina para aplicar os conceitos morais, físicos e de saúde. "Atenção na alimentação, por exemplo. A gente, quando fica mais velho, precisa modificar os hábitos porque o nosso corpo altera o sistema alimentar, ele não funciona como antigamente. Eu aprendi, de verdade, a pensar quais são as consequências do meu envelhecimento", destaca Adiniz.

"Aprender a envelhecer: este foi o ponto que mais me pegou durante o curso. Ele acrescentou muito de conhecimento a nossa vida para que a gente possa viver melhor daqui para frente", indica Miriam.

Formaram-se 104 alunos de três turmas diferentes. Para a maioria, este foi o primeiro diploma da vida. Para conhecer mais sobre o projeto e ver o calendário de matrículas, e o site do UniSER aqui.