
As impressões sobre o primeiro dia de votação no conclave — processo de escolha do novo líder da igreja católica —, assim como a influência do papa Francisco para o próximo pontífice, foram temas abordados, ontem, pelo doutor em ciência da religião Vicente Paulo Alves, durante o CB.Poder — parceria entre o Correio Braziliense e a TV Brasília. Aos jornalistas Carlos Alexandre e Sibele Negromonte, o professor do curso de teologia da Universidade Católica de Brasília (UCB) comentou sobre as mudanças na organização política do Vaticano promovidas pelo último líder católico.
Qual mensagem o senhor acha que os cardeais estão preocupados em dar nesta primeira votação do conclave?
Eu acredito que é procurar realmente aquele perfil de um papa que tenha realmente liderança e que expresse um pouco a confiança que o mundo todo depositou no papa Francisco. Ou seja, talvez um perfil que realmente se aproxime muito do que o papa Francisco fez. O legado que ele deixou é um legado que a gente não pode mais apagar. Havia realmente um diálogo interreligioso com as diferentes opiniões e com os diferentes saberes.
Qual a importância das congregações antes do conclave?
Pode ser que nessas congregações tenha sido dado o primeiro o para definir quem vai ser o papa. No conclave anterior, por exemplo, o candidato Jorge Bergoglio, futuro papa Francisco, começou a ganhar notoriedade após um discurso que fez sobre uma igreja voltada aos pobres. Então, nesse conclave, também pode ter um cardeal que se destacou por algum discurso ou posicionamento. É nas congregações que as alianças são construídas.
O legado do papa Francisco tem influência nesse conclave?
Eu acredito que o papa Francisco veio com uma missão. Quando ele recebeu a Igreja, ele fez alguns apontamentos sobre a organização e sobre alguns assuntos que estavam sendo colocados em baixo do pano, como, por exemplo, a punição dos padres que cometeram pedofilia, coisas que o Bento XVI não conseguiu fazer. Isso foi um avanço considerável. Acredito que o próximo papa dará continuidade a esses avanços.
O papa Francisco também se posicionou algumas vezes em relação à saúde financeira do Vaticano, afirmando que a Igreja precisava ter atenção quanto a isso. Como o senhor avalia esse posicionamento?
De certa forma, ele também cuidou do banco do Vaticano para evitar escândalos. O comportamento dele é um exemplo a ser seguido: ele não quis um carro sofisticado e escolheu um anel de prata em vez de um de ouro, que era tradição. Então, foram os pequenos detalhes que mostraram a personalidade e a preocupação com a imagem e as finanças da Igreja. Além disso, o papa também demonstrava muito interesse em acolher as pessoas menos favorecidas. Ele fez a diferença em relação aos bens que a Igreja tinha. Por causa dele, alguns edifícios da Igreja foram cedidos para ficar à disposição de pessoas em situação de rua de Roma, lá eram servida comida para essa população. Ele fez também uma lavanderia, colocou máquinas de lavar roupa para aquelas pessoas que estão, às vezes, até na Praça de São Pedro, para poder ter alguma higiene.
Francisco também estreitou relações com outras religiões. Qual a importância dessa ação?
Eu acho que ele não deixou só os documentos da Igreja que falavam sobre um diálogo interreligioso, assim como está nos documentos do Vaticano II. Ele deu os concretos para isso. Ele chamou alguns líderes mundiais e religiosos à Roma, como fez com a autoridade máxima da igreja ortodoxa. Além disso, fez visitas a países islâmicos e conversou com líderes muçulmanos. As ações dele refletiam muito essas intenções dessa aproximação. Ele foi em Jerusalém e visitou o Muro das Lamentações. Temos, de fato, a imagem de um papa acolhendo o outro. Isso é fundamental.
Em uma nota feita pelos cardeais antes da congregação geral de ontem, foi muito falado sobre a busca da paz. O senhor acredita que essa tendência ainda vai ser seguida?
Foi muito bom que tenha tido essa carta dos cardeais, mostrou que a escolha do futuro papa não vai ser apenas para as questões internas da Igreja. Essa carta mostrou que nós queremos um líder que trabalhe para a paz. E se não tiver uma autoridade moral como o papa, para poder realmente chamar a atenção dos líderes religiosos e colocar a diplomacia do Vaticano à disposição, não iremos conseguir realmente vencer esse momento tão difícil que a humanidade está ando.
*Estagiário sob a supervisão de Patrick Selvatti