
Um dos principais nomes da música instrumental contemporânea, o bandolinista, compositor e improvisador Hamilton de Holanda se junta mais uma vez com o baterista Thiago "Big" Rabello e o tecladista Salomão Soares para um novo trabalho. Gravado ao vivo no Dizzy's Club, em Nova York, o álbum Hamilton de Holanda Trio - Live in NYC reforça a conexão entre os músicos que iniciaram parceria em 2023, com o disco Flying chicken. O projeto, lançado neste mês, ainda conta com a participação especial do saxofonista norte-americano Chris Potter, um dos grandes nomes do jazz contemporâneo.
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"Eu tenho uma confiança muito grande no Big e no Salomão", afirma Hamilton. "Eu os iro muito, e isso foi algo construído com os anos. Essa gravação, por exemplo, foi arquitetada durante o período de um mês, apesar de se tratar do registro ao vivo de uma única apresentação", conta o músico. "amos um mês inteiro fazendo turnê pelos Estados Unidos e, durante esse tempo, a gente gravou cada show, para que, no dia seguinte, a gente pudesse ouvir a performance toda e apontar o que podia melhorar e o que já estava legal", explica.
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Segundo Hamilton, o período foi essencial para solidificar a sintonia e confiança entre os instrumentistas. "Quando chegamos em Nova Iork, já estávamos com o casco superafiado. A gente fechava os olhos e sabia o que o outro iria fazer, não precisava falar nada. Isso nos deu uma segurança e uma leveza também, porque já estávamos no automático. Assim, pudemos curtir mais, deixamos a emoção falar de uma maneira diferente. A gente não precisou prestar tanta atenção na parte técnica, que já estava toda resolvida", relata o bandolinista. O registro final foi feito em outubro de 2024.
Presente em três faixas do álbum, Chris Potter foi "a cereja do bolo" no projeto, de acordo com Hamilton. "Ele é um músico extraordinário, que já havia participado de um álbum meu (Flying chicken) e de uma turnê pelo Brasil também. Nesse trabalho, ele chega com a força de um cara que tem um som de saxofone superlindo e único. Você ouve o fraseado dele, a respiração, e já sabe quem é", exalta o instrumentista brasileiro.
"Para mim, foi um sonho, porque eu sempre achei que o choro e o jazz dividem uma mesma herança africana, com essa característica da liberdade e da improvisação. Ter registrado esse encontro com o Chris em um templo do jazz é incrível. Quero que chegue a todos os ouvidos do mundo", acrescenta.
Conhecido por ser um exímio improvisador, Hamilton garante que, apesar de bem ensaiado, o show teve, sim, espaço para o inesperado. "Depois que a gente toca os temas prédefinidos, a gente entrega para Deus", brinca o bandolinista. "É aí que vem a magia, no improviso, porque é o momento em que aquilo que a gente já sabe se encontra com aquilo que a gente ainda vai descobrir. É de arrepiar. E o público percebe que é algo que está sendo feito na hora. Essa é uma das essências do jazz e do choro. E o Chris é um mestre nessa parada", diz.
Em cima do palco, os músicos também puderam contar com a participação do público durante as faixas Deus é amor pra tudo que é fé, Mantra da criação e Sol e luz. "Eu gosto muito de fazer com que as pessoas que estão no palco e as que estão na plateia formem um grupo só, como se fosse uma grande orquestra. Então, em alguns momentos, eu ensino palmas a eles, porque aí a greve groova, fazendo o ritmo da música junto com quem está assistindo", relata.
Para Hamilton, a ausência da barreira linguística é uma das características que torna a música instrumental tão especial. "Eu ensino a melodia sem falar uma palavra, só tocando o bandolim. Eu não canto uma sílaba, e, ainda assim, a plateia entende e canta comigo. Quando eu ouvi o resultado lá na hora, foi uma emoção enorme, e, quando eu escutei na gravação, tive a mesma sensação. Talvez seja o momento mais emocionante do disco", avalia o compositor.
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Do Brasil para o mundo
Detentor de 17 indicações ao Grammy Latino, Hamilton de Holanda, neste ano, celebrou uma nova conquista — a nomeação ao Grammy Awards, principal premiação musical do mundo. Ele concorreu ao prêmio de Melhor álbum de jazz latino por Collab, trabalho em parceria com o pianista cubano de jazz Gonzalo Rubalcaba. "A nossa cultura já é muito irada, então, não é surpresa que as pessoas gostem. Quando eu chego aos lugares, é um orgulho danado pisar no palco, tocar uma ou duas notas e as pessoas já reconhecerem como música brasileira", celebra.
"Também é muito importante para mim me conectar e aprender com outros estilos, como o próprio jazz, e mostrar para os demais artistas o que temos no Brasil. A gente tem que fazer uma troca, porque quanto mais eu aprendo sobre outras culturas, mais eu me reconheço na minha própria. Quanto mais eu ouço e toco músicas de outros lugares, e vejo outras pessoas tocando a nossa, eu consigo reconhecer o que é nossa raiz e o que não é. Assim, a minha arte fica ainda mais universal, aberta e global, mas com a essência e herança brasileira sempre presente", pondera o bandolinista.
Amor a Brasília
Carioca de nascença, Hamilton de Holanda viveu na capital federal dos 11 meses até os 25 anos de idade. "Brasília é meu amor, é minha sorte", declara o artista. "Foi Brasília que me formou, como pessoa e como músico", assegura o brasiliense de coração. Apesar de atualmente morar no Rio de Janeiro, o instrumentista faz questão de se fazer presente na cidade em que foi criado: "Eu quero voltar sempre para Brasília, porque é a minha maneira de estar vendo o que está rolando, conhecendo novos músicos, além de ser minha forma de retribuir a gratidão que eu tenho pelas coisas que vivi".
"Tudo que eu aprendi foi na Escola de Música de Brasília. É um lugar onde eu aprendi muita coisa, então, sempre vou estar por lá ou pelo Clube do Choro", cita o artista. "Também estou doido para que abra logo a sala Villa Lobos, que está fechada há muito tempo, para que eu possa me apresentar lá", declara o ex-morador Asa Sul.
Fora dos palcos, Hamilton costuma aproveitar o tempo livre na cidade para visitar a mãe e o irmão, que ainda moram no quadradinho, além de almoçar no tradicional Xique-Xique. "A qualidade de vida em Brasília não existe em outro lugar. Tenho um amigo que diz que é a Noruega brasileira", ri.