O C6 Fest retornou para mais um ano no Parque do Ibirapuera em São Paulo. O evento que traz o melhor do Jazz e da música indie na atualidade para o Brasil, teve o início das atividades no auditório do Ibirapuera. A noite de abertura foi dos veteranos às novidades e teve como destaque uma curadoria diversa e diferente dos outros festivais brasileiros da atualidade.
O C6 Fest começa nesta quinta (22/5) e continua até domingo (25) e, a convite do festival, o Correio acompanha os próximos dias que terão shows de Meshell Ndegeocello, Nile Rogers & Chic, Air, Wilco, entre outras grandes atrações.
Clássico do Jazz 4m3e62
Quem abriu os trabalhos foi o saxofonista e lenda do jazz Joe Louvano com o projeto Tenor Legacy. Ele teve a dura tarefa de substituir de última hora o jazzista etíope Mulatu Astatke que, devido a um infarto, encontra-se internado e teve que cancelar a apresentação.
No entanto, a escolha de Louvano era a mais segura possível. O norte-americano de 72 anos e longa caminhada na estrada jamais sentiria a pressão. O músico já tocou nos principais palcos do jazz mundial e fez parceria com gigantes do gênero. Com toda essa bagagem trouxe um quinteto e apresentou um free jazz de qualidade para o público em São Paulo.
O artista não perdeu tempo. Ao chegar, exaltou o retorno aos palcos paulistas. Depois disso, só gastou saliva na paleta do saxofone. Com piano, contrabaixo, bateria e dois saxofones, o show teve momentos para cada um dos instrumentistas brilharem em improvisações. No fim apresentou a banda e agradeceu mais uma vez.
Com músicas que muitas vezes avam de 10 minutos na execução, Joe Louvano criou ali no palco um caos controlado, em que os sons se sobrepam sem atropelamentos. O músico soube ganhar o público ao mostrar que tudo que fazia era ensaiado e pensado para funcionar como funcionou.
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Representante do Brasil 4o1i1w
Único brasileiro a performar nos dois dias de shows no auditório, Amaro Freitas trouxe um septeto para uma apresentação especial pensada para o C6 Fest. A composição de banda escolhida foi o virtuoso piano de Amaro acompanhado de trompete, flauta, saxofone, contrabaixo, percussão e bateria. Apesar de terem ensaido juntos apenas duas vezes nessa formação, os instrumentistas estavam entrosados como se tocassem a décadas lado a lado.
O pianista pernambucano apresentava um ar de rockstar nas vestimentas com óculos escuros e uma longa bata preta. Porém, as roupas não escondiam o sorriso e a animação de um jovem de 33 anos que construiu um show carregado da própria essência. Amaro fez um show sincopado e de brasilidade em um terreno em que aram e ariam referências do jazz mundial. “Em um festival que traz um território de música internacional, eu queria trazer um show que tivesse a música brasileira mas que dialogasse com a cena do jazz mundial”, falou o músico no palco sobre o novo show.
O artista teve a coragem de colocar improvisações de pandeiro, teve a destreza ao executar notas de piano preparado com loops e, mais do que isso, teve a noção de que representava um país diverso dentro daquele auditório. Amaro entregou o show mais energético da noite e se consolida como um dos mais originais e potentes talentos da geração que faz parte na música brasileira, independentemente do fato de ser um artista majoritariamente instrumental.
Música para transcender 1f219
A responsável pelo encerramento da noite foi a cantora Arooj Aftab. Nascida na Arábia Saudita, filha de pais paquistaneses, a artista é naturalizada paquistanesa e se tornou a primeira cidadã do país a ganhar um Grammy. Aos 40 anos, ela emergiu de uma cena menos popular e se tornou uma queridinha da crítica especializada e nesse status chegou para a primeira apresentação em São Paulo no C6 Fest.
Apesar de ter sido colocada em meio aos artistas de jazz, Aftab não se entende dentro de nenhum gênero especifico na musica ocidental. Ela intitula o som que faz como neo-sufi, um novo olhar para o sufismo, que no Islamismo é uma conexão entre o humano e o transcendental. Ou seja, a cantora, de voz ímpar, faz um show que parece elevar o público a um diálogo com o que ela acredita como divino.
Mesmo com todo peso que é uma conexão com uma força superior na forma como cria a própria música, Aftab é uma pessoa divertida no palco. O tempo todo fazendo piadas com o público, chegando a distribuir doses de whisky para a plateia, ela mostra uma faceta interessante e distinta de uma artista tão cult. O show é simples nas falas, sofisticado nas canções e a em um piscar de olhos.
No lado musical, a cantora faz todas as escolhas inesperadas. Com uma banda formada por bateria, contrabaixo, flauta e harpa e a maioria das músicas cantadas em uma mescla de urdu, língua oficial do Paquistão, e inglês. A artista parece se utilizar das estruturas formais da música ocidental para adaptar um estilo oriental de som que é difícil de descrever, mas fácil de apreciar. Em uma das apresentações mais carregadas de emoção da noite, Arooj Aftab, sem esforço, elevou o auditório para próximo do transcendente.