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postado em 04/05/2025 06:00 / atualizado em 04/05/2025 06:00

. - (crédito: Maurenilson Freire)
Por Donne Pisco*
A recente decisão do Supremo Tribunal Federal (STF) de suspender todos os processos que discutem a legalidade da pejotização representa mais do que uma pausa procedimental. Ela impõe às empresas uma reflexão estratégica sobre a forma como estruturam suas relações de trabalho em um mercado cada vez mais dinâmico e exigente.
Pejotização é o termo que designa a prática de contratar trabalhadores como pessoas jurídicas, ainda que, na essência, a prestação de serviços mantenha características de vínculo empregatício, como subordinação, pessoalidade e habitualidade. Quando mal empregada, transforma-se em um instrumento de precarização das relações laborais e expõe empresas a riscos jurídicos e financeiros significativos.
Embora o STF tenha autorizado, em decisões anteriores, a terceirização de atividades-fim (ADPF 324 e RE 958252), não o fez em relação à pejotização, especialmente quando utilizada com o propósito de ocultar vínculos empregatícios.
Mais do que revisar contratos, é hora de reestruturar a cultura interna de compliance trabalhista. A simples formalização de contratos não protege a empresa se, no dia a dia, o prestador for tratado como empregado. É fundamental investir na capacitação de gestores, estabelecer políticas claras de contratação e reforçar orientações para líderes que lidam diretamente com prestadores de serviço.
- Leia também: Pejotização no STF: o que está em jogo no julgamento que paralisou todas as ações do tema pelo Brasil
Do ponto de vista técnico, entendo que a suspensão dos processos reflete uma necessidade urgente de harmonizar o tratamento jurídico da pejotização no país. Atualmente, o cenário é fragmentado: a mesma prática pode ser considerada lícita em uma instância e fraudulenta, em outra. A decisão do STF é, portanto, um o para trazer previsibilidade ao direito do trabalho e fixar balizas claras para a autonomia privada nos contratos de prestação de serviços.
É preciso também separar o debate da pejotização do fenômeno da “uberização”, que envolve o trabalho mediado por plataformas digitais. Cada uma dessas formas impõe desafios próprios e exige respostas específicas do ordenamento jurídico.
O principal erro de muitas empresas é encarar a pejotização apenas como ferramenta de economia. A contratação via PJ exige muito mais do que a formalização de um CNPJ: pressupõe liberdade de horários, múltiplos clientes, ausência de subordinação e autonomia real. Ignorar essas condições é correr riscos desnecessários.
A decisão do Supremo é um sinal claro: a flexibilização do trabalho é bem-vinda, mas não às custas da descaracterização dos direitos trabalhistas. A empresa que adotar uma postura preventiva e estratégica — valorizando a real autonomia dos prestadores — estará mais protegida, não apenas juridicamente, mas também na reputação no mercado.
O mercado de trabalho do futuro será marcado por modelos contratuais plurais. Mas quem quiser se manter competitivo precisará conjugar flexibilidade e responsabilidade. A pejotização, se artificial, é uma armadilha. Se aplicada com critério e respeito, pode integrar soluções legítimas para novos tempos.
Enquanto aguardamos o julgamento definitivo do STF, cabe às empresas fazerem a lição de casa: mais do que revisar contratos, é hora de rever mentalidades.

*Advogado especializado em direito do trabalho e empresarial, sócio da Pisco & Rodrigues Advogados