
Um dos motivos que impediram a execução de um golpe de Estado no Brasil, segundo investigação da Polícia Federal, foi a não adesão ao plano por parte dos comandantes do Exército, general Marco Antonio Freire Gomes, e da Aeronáutica, tenente-brigadeiro Carlos de Almeida Baptista Junior.
O relatório do inquérito, que teve o sigilo retirado pelo ministro do Supremo Tribunal Federal (STF) Alexandre de Moraes, aponta que o objetivo do golpe seria manter no poder o então presidente Jair Bolsonaro (PL), que havia perdido a eleição para Luiz Inácio Lula da Silva (PT).
Entre as ações planejadas estavam o assassinato de Moraes, Lula e o vice-presidente eleito Geraldo Alckmin (PSB).
De acordo com a Polícia Federal, por mais de uma vez, integrantes das Forças Armadas tentaram convencer e pressionar tanto Freire Gomes quanto Baptista Junior a aderir ao plano golpista.
Isso se deu por meio de reuniões presenciais, troca de mensagens e coordenação de ataques pessoais nas redes sociais.
Segundo a PF, o apoio dos comandantes era fundamental para garantir o e armado para as medidas de exceção que seriam adotadas por Bolsonaro para se manter no poder.
"A resistência dos Comandantes do Exército e da Aeronáutica impediu a consumação do ato, fato que recrudesceu os ataques da milícia digital e de militares aderente à ruptura institucional aos referidos comandantes e ao demais militares de alta patente contrários ao golpe de Estado", diz um trecho do relatório.
Comandantes foram pressionados a aderir ao golpe
De acordo com o inquérito, no dia 07 de dezembro, Bolsonaro reuniu no Palácio do Alvorada os comandantes das Forças Armadas, Almirante Garnier (Marinha), tenente-brigadeiro Baptista Junior (Aeronáutica), general Freire Gomes (Exército), e o ministro da Defesa, general Paulo Sergio Nogueira. Na reunião, o então presidente teria apresentado a minuta do decreto de golpe de Estado.
"O objetivo naquele momento era obter o apoio dos comandantes para que as Forças Armadas garantissem a consumação da empreitada criminosa", diz o relatório da Polícia Federal.
O comandante da Marinha, almirante Garnier, teria se colocado à disposição para cumprimento das ordens de Bolsonaro. Contudo, tanto Freire Gomes quanto Baptista Junior "se posicionaram contrários a aderir a qualquer plano que impedisse a posse do governo legitimamente eleito".
Segundo a PF, o general Freire Gomes, em especial, era tratado como um "obstáculo a ser vencido", o que levou os militares a elaborar e executar ações para pressionar o comandante do Exército a participar do "intento golpista”.
Durante o mês de dezembro, os oficiais das Forças Armadas e membros do governo Bolsonaro "tentaram de todas as formas convencer os comandantes do Exército e da Aeronáutica a aderirem ao golpe de Estado em execução", relata a PF.

No dia 14 de dezembro de 2022, o Ministro da Defesa, general Paulo Sergio, teria realizado uma reunião no gabinete do Ministério da Defesa com os três comandantes das Forças Armadas a apresentado uma nova versão do decreto "que subverteria o Estado de Direito no Brasil", segundo o relatório.
O documento, segundo depoimento de Freire à PF, era mais abrangente do que o apresentado anteriormente por Bolsonaro, mas também decretava o Estado de Defesa e instituía a criação da Comissão de Regularidade Eleitoral para "apurar a conformidade e legalidade do processo eleitoral".
Freire Gomes e Baptista Junior teriam mais uma vez se negado a aderir ao plano golpista, dizendo que "não concordariam com qualquer ato que impedisse a posse do governo eleito".
Baptista Junior relatou à Polícia Federal que disse ao Ministro da Defesa que "não itiria sequer receber o documento e que a Aeronáutica não itiria um golpe de Estado". Em seguida, saiu da sala.
Já Freire teria pontuado que Bolsonaro “não teria e jurídico para tomar qualquer atitude”.
Ataques articulados nas redes sociais
Diante da resistência dos comandantes do Exército e da Aeronáutica, o grupo de militares, sob ordem do general Braga Netto, ou a 'recrudescer' ataques pessoais (inclusive a familiares) a Freire Gomes e Baptista Junior, para ar uma imagem de que eles eram "traidores de pátria" e "alinhados ao comunismo".
Segundo a PF, os militares atuaram, dentro da divisão de tarefas estabelecida pela organização criminosa, para aplicar o modus operandi desenvolvido pela "Milícia Digital" e disseminar informações falsas "em alto volume, por multicanais, de forma contínua e repetitiva".
"Os comandantes foram inseridos em uma máquina de amplificação de ataques pessoais – os chamados 'espantalhos' – com a finalidade de compeli-los a aceitarem o golpe de Estado", relata a PF.
Plano abortado
O inquérito da Polícia Federal destaca o dia 15 de dezembro de 2022 como uma data relevante para todo o contexto golpista.
Naquela manhã, o general Mario Fernandes encaminhou uma mensagem para o general Ramos, então secretário-geral da Presidência da República, relatando que o comandante do Exército iria até o palácio da Alvorada para comunicar apoio ao decreto.
Mas, segundo a PF, Freire Gomes manteve sua posição institucional e rechaçou o emprego da força terrestre para dar o e a Bolsonaro para "promover a ruptura institucional".
"Tal fato não gerou confiança suficiente para o grupo criminoso avançar na consumação do ato final e, por isso, o então presidente da República Jair Bolsonaro, apesar de estar com o decreto pronto, não o assinou", destaca a PF.
Naquele dia também, militares estavam a postos para executar uma das etapas do plano, que envolvia a prisão e/ou execução do ministro Alexandre de Moraes, que acabou não acontecendo.
"Diante do encerramento precoce da sessão no Supremo Tribunal Federal e da posição intransigente do comandante do Exército em não aderir ao intento golpista, a ação foi 'abortada' pelos criminosos", diz outro trecho do relatório.
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