Poder

Governo Lula: queda da popularidade em pesquisas chega em má hora

Mesmo com economia em alta, mais brasileiros "desaprovam" a gestão petista, enquanto os índices dos que avaliam o governo como "ruim" ou "péssimo" têm subido. Para especialistas, falas do presidente sobre Israel contribuíram

Lula tem que cuidar da popularidade, especialmente após ações recentes da extrema-direita, dizem analistas -  (crédito:  Ed Alves/CB/DA.Press)
Lula tem que cuidar da popularidade, especialmente após ações recentes da extrema-direita, dizem analistas - (crédito: Ed Alves/CB/DA.Press)

Mesmo com os bons resultados econômicos recentes, a avaliação positiva do presidente Luiz Inácio Lula da Silva caiu nas últimas pesquisas divulgadas. Os levantamentos mostram que diminuiu o otimismo do eleitor com a economia. Também repercutiram mal as declarações do petista comparando a ação de Israel na Faixa de Gaza à Alemanha nazista, maior fator para a queda de popularidade. Para especialistas, as falas sobre Israel podem ter refletido na percepção econômica, especialmente devido à polarização entre os eleitores. As pesquisas mostram também uma insatisfação com os preços de alimentos e combustíveis, que afetam diretamente a vida da população.

O governo federal apresentou bons resultados econômicos nas últimas semanas, relativos ao primeiro ano do mandato. O Produto Interno Bruto (PIB) de 2023 cresceu 2,9% em relação ao ano anterior e fez o Brasil atingir o posto de 9ª maior economia do mundo, superando Canadá e Rússia. A meta de inflação do Banco Central foi atingida, e a taxa básica de juros sofreu sucessivos cortes desde junho do ano ado, chegando ao patamar atual de 11,75%.

O grande ponto de atrito foi a questão fiscal. Enquanto o ministro da Fazenda, Fernando Haddad, defende que o deficit zero será atingido até o fim deste ano, Lula prioriza o investimento em políticas públicas, como o Bolsa Família e o Novo Programa de Aceleração do Crescimento (PAC), em detrimento da diminuição da dívida. Esse é um dos principais pontos usados pela oposição para atacar a área econômica junto à sua base.

Apesar dos resultados, os levantamentos mostraram uma redução no otimismo da população. Na Quaest realizada no fim de fevereiro, 38% dos participantes avaliam que a economia piorou (contra 31% na última pesquisa, em dezembro), 26% dizem que melhorou (contra 34%), e 34% opinam que ficou do mesmo jeito (contra 33%). Já sobre a perspectiva econômica para o futuro, 46% acham que vai melhorar (55% em dezembro), 31% acreditam que vai piorar (25% em dezembro), e 19% que vai ficar do mesmo jeito (16% em dezembro).

Aumento nos preços

Uma queda parecida foi mostrada pela pesquisa AtlasIntel, realizada nos primeiros dias de março, contra os dados divulgados em janeiro. Entre os participantes, 53% vêem a economia atual como ruim (contra 47%), 28% como boa (29%), e 19% avaliam como normal (24%). Sobre a expectativa para os próximos seis meses, 50% esperam melhora (52%) e 42%, piora (37%).

Um dos fatores que ajudam a explicar a mudança na percepção econômica são mudanças recentes nos preços para o consumidor. De acordo com a Quest, 73% dos brasileiros sentiram aumento nos alimentos, 63% nas contas em geral, e 51% nos combustíveis. Segundo o Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística (IBGE), houve um pico nos preços de alguns alimentos no início do ano, devido às altas temperaturas e às chuvas em regiões produtoras. Em janeiro, a inflação foi de 1,38% para os alimentos, mas desacelerou para 0,97% em fevereiro, segundo a prévia do Índice de Preços ao Consumidor Amplo (IPCA). O preço da gasolina nas bombas, por sua vez, aumentou 12,5% em 2023, e subiu novamente em fevereiro após aumento das alíquotas do ICMS.

Otimismo

No governo, os resultados foram atribuídos às falas recentes do presidente sobre Israel. A maior queda na avaliação se deu entre evangélicos e, segundo a Quaest, 60% dos brasileiros acham que as declarações foram exageradas. O ministro da Secretaria de Comunicação Social (Secom), Paulo Pimenta, apontou que não houve "nenhuma surpresa" nos dados divulgados, mas que não há chances de Lula mudar seu posicionamento. A expectativa é de que o impacto na avaliação seja pontual, e e com o tempo.

Em seu primeiro discurso após a divulgação das pesquisas, na quinta-feira, Lula ironizou a "sorte" que tem em seu governo e rebateu as críticas, dizendo nunca ter visto um otimismo tão grande com os rumos do país. "De repente, como se fosse um e de mágica, eu tenho sorte. De repente, nós, neste começo do ano, já recebemos um anúncio de investimento de quase R$ 100 bilhões na indústria automobilística nos próximos três anos", disse o presidente.

Governistas também agem para desvincular a imagem de Lula de resultados econômicos ruins. Um exemplo foi a divulgação da queda de 33,8% no lucro da Petrobras em 2023. Apesar das críticas a falas recentes do presidente sobre o aumento da política de investimentos — que geraram temor sobre o aumento do endividamento da estatal —, a presidente nacional do PT, deputada federal Gleisi Hoffmann (PT-PR), argumentou que as críticas são apenas desculpas para atacar a gestão. "O que houve no mundo do petróleo em 2023 foi um retorno aos preços praticados antes da guerra da Ucrânia, mas querem é falar mal do Lula. Não é ignorância, é má fé!", escreveu em sua conta no X (antigo Twitter).

Para o advogado e cientista político Nauê Bernardo, a polarização tem grandes reflexos nos índices de aprovação do presidente Lula, e deve ser levada em conta na interpretação dos dados. "É uma análise que não pode ser feita desligada desses elementos, que envolvem a própria ideologia das pessoas", avaliou ao Correio. Segundo ele, se o governo quiser reverter essa queda na percepção da economia, é preciso investir em medidas que sejam sentidas diretamente pelos eleitores.

"A população precisa parar de sentir coisas como o aumento do preço dos insumos alimentares, dos custos gerais das suas vidas. É preciso que o governo faça com que haja um aumento da sensação de bem-estar, e assim questões um pouco mais laterais, como a política externa, vão acabar ficando mais de lado", explicou Nauê.

Já o professor de ciência política do Centro Universitário UDF André Rosa disse desconfiar da qualidade das pesquisas divulgadas em relação à economia, já que os indicadores recentes são positivos. Porém, reforça o impacto das falas de Lula sobre Israel, que podem refletir em outros índices. "O eleitor coloca tudo na mesma cesta", pontuou. Ele destacou também que o governo tem que cuidar da popularidade, especialmente após ações recentes da extrema-direita.

"A reação do governo agora deve ser falar menos de Israel. Jair Bolsonaro mostrou força na Avenida Paulista, não vamos negar. E, agora, a gente vem vendo o Donald Trump com tudo nos Estados Unidos. Querendo ou não, as eleições de lá influenciam as nossas", completou.

 

Gostou da matéria? Escolha como acompanhar as principais notícias do Correio:
Ícone do whatsapp
Ícone do telegram

Dê a sua opinião! O Correio tem um espaço na edição impressa para publicar a opinião dos leitores pelo e-mail [email protected]

postado em 11/03/2024 03:55
x