
A pandemia deixou muitas cicatrizes, e muitas delas nunca vão se curar. Foram, ao todo, 715.610 mortes. Os dados, disponíveis no portal Coronavírus Brasil, do Ministério da Saúde, também mostram que houve 39.232.810 casos acumulados da doença. Entre os sobreviventes, além das possíveis sequelas físicas, ficaram também as psicológicas.
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E essas marcas emocionais e na saúde mental não se limitam aos contaminados, elas se estendem à maioria das pessoas que viveram a pandemia, seja os que ficaram completamente isolados por anos, seja os que tinham que sair todos os dias para trabalhar e nunca viveram reclusos. Além, é claro, dos que perderam pessoas amadas.
A pandemia do coronavírus foi seguida por uma explosão de novos casos de desequilíbrios na saúde mental. Nesse cenário, uma resolução que já existia sem despertar tanto interesse da população em geral se transformou em uma tábua de salvação. Regulamentada há cerca de seis anos pela Resolução CFP nº 11/2018, do Conselho Federal de Psicologia, a terapia on-line foi o que permitiu que pessoas que já lutavam com questões de saúde mental continuassem seus tratamentos de psicoterapia sem se colocar em risco de contaminação.
A psicóloga da rede de clínicas Meu Doutor Novamed, Gabriela Braga acrescenta que a modalidade também atraiu muitos novos pacientes, que pela rotina atribulada do dia a dia não encontravam tempo para o cuidado ou que aram a precisar desse tipo de terapia justamente em função das questões trazidas pelo coronavírus.
E como já existia antes da pandemia, a terapia on-line continuou existindo depois do fim da crise sanitária, com o adendo de que, agora, é amplamente conhecida pela maioria da população e ou a ser mais ofertada pelos profissionais e serviços de saúde.
Sílvia Oliveira, psicóloga e psicanalista em Brasília, comenta que, durante o isolamento, a opção se consolidou como essencial, e tanto os pacientes quanto os profissionais de saúde perceberam suas vantagens, o que garantiu sua continuidade.
A psicóloga comenta que grande parte dos pacientes que optou por permanecer na modalidade é formada por aqueles com rotinas muito intensas, que valorizam a praticidade e o conforto de serem atendidos de qualquer lugar. "Além disso, pessoas que moram em cidades menores ou locais sem o a profissionais especializados também se beneficiam muito."
Gabriela Braga acredita que o fácil o à terapia, a comodidade e a facilidade de inclusão na rotina diária, assim como a redução do deslocamento são pontos fundamentais quando se fala na alta procura pelas sessões de psicoterapia a distância.
Alternativa ao medo de sair de casa
Voltando para antes da pandemia, a terapia on-line já era uma carta na manga para o tratamento de pessoas com condições como agorafobia, síndrome da cabana e síndrome da gaiola, em que o medo de sair de casa é um dos principais sintomas, ou até mesmo a Hikikomori, um tipo de isolamento autoimposto em que o indivíduo prefere viver no ambiente virtual. Pessoas com dificuldade de locomoção também estão entre os beneficiados. Além, é claro, de condições de depressão e ansiedade severa.
"É fundamental garantir o o ao acompanhamento psicológico. No início, esse e é essencial para que a pessoa se sinta segura para buscar e receber ajuda. Com o avanço do tratamento, essas dificuldades podem ser trabalhadas e reduzidas gradativamente", comenta Gabriela.
Afinal, embora seja importante garantir o cuidado para a saúde mental e emocional dessas pessoas, é necessário trabalhar para que elas consigam, eventualmente, voltar a viver em sociedade. A psicóloga explica que somos seres sociáveis, de forma que temos a necessidade de manter algum nível de relação interpessoal.
Sílvia também chama atenção para a necessidade de que o tratamento psicológico, mesmo on-line, tenha como objetivo uma melhora nas condições que impedem os pacientes de sair de casa, ressaltando que ela deve funcionar como um apoio e não um fator que contribua para o isolamento. "É essencial encontrar um equilíbrio. O terapeuta pode trabalhar estratégias para que o paciente volte a se expor gradualmente, sem forçar, mas também sem reforçar a evitação. A conexão humana e as interações presenciais são importantes para o bem-estar emocional", completa.
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Democratização terapêutica
Considerada um luxo por muitas pessoas, o cuidado com a saúde mental por meio da psicoterapia também se tornou mais ível. Muitos profissionais aram a atender sem a necessidade de ter um espaço físico, o que diminui os custos e permite manter um valor mais baixo para os pacientes que precisam.
"A democratização do o à terapia é um dos maiores benefícios desse modelo. Em regiões onde há escassez de profissionais qualificados, a terapia on-line permite que mais pessoas recebam apoio psicológico, reduzindo desigualdades no o à saúde mental", acredita Sílvia.
Aline Thomasi, superintendente sênior de Gestão de Rede da Bradesco Saúde, que disponibilizou a plataforma Psicologia Viva para atender pacientes remotamente, defende que a saúde mental é um pilar essencial para uma vida plena e equilibrada, influenciando diretamente o bem-estar emocional, físico e social.
"Em tempos em que o estresse, a ansiedade e outros transtornos são cada vez mais comuns, cuidar da saúde mental é um investimento em qualidade de vida e poder fazer isso de casa, com mais conforto e menos custos é um grande benefício", afirma.
Apesar de todos os benefícios que a terapia on-line pode trazer e de pacientes que não teriam o a esse tipo de tratamento em outras modalidades, é importante mencionar também as limitações inerentes ao atendimento remoto.
Questões como instabilidade da conexão de internet e dificuldades para encontrar um ambiente privado podem interferir na qualidade das sessões. "A falta de um contato mais direto entre terapeuta e paciente pode dificultar a leitura da linguagem corporal e outros sinais sutis. Para alguns casos mais complexos, o atendimento presencial ainda pode ser a melhor opção", completa Sílvia.